Por conta do crescimento acelerado das vendas no e-commerce como resultado do isolamento social gerado pela COVID-19, combinado com a redução das vendas do varejo físico, a participação do comércio eletrônico no varejo total em 2020 pode dobrar em termos percentuais, chegando próxima, ou superando, os 10%. E só vamos ter esse número em definitivo no fechamento do ano, pois até lá muita coisa ainda pode acontecer.
Dependendo dos critérios, das categorias e segmentos envolvidos e da fonte de apuração dos dados, pode ser estimado que o resultado das vendas do comércio eletrônico no Brasil em 2020 poderá oscilar entre R$ 100 e 120 bilhões, uma expressiva variação exatamente por conta das diferenças mencionadas e o volátil comportamento do mercado.
Antes da pandemia as estimativas apontavam crescimento entre 15 e 25% das vendas do comércio eletrônico em 2020 sobre 2019. No momento atual os números se situam na faixa de 60-70%. Esse resultado somente ocorreu em 2006 nos primórdios do e-commerce quando cresceu 76% com base ainda muito pequena chegando a R$ 4,4 bilhões em faturamento ou 25 vezes menor que a previsão deste ano.
Considerando os diferentes institutos, empresas e entidades com apuração primária de dados do e-commerce, como Ebit-Nielsen, ABComm, ICVA Cielo, Mastercard Spending Pulse, Compre e Confie, Locaweb, IBGE e outros, os números e percentuais variam muito por conta das diferenças de critérios, categorias e segmentos, fonte e base de dados envolvidos.
Mas o que não varia é a clara percepção do salto que o canal e-commerce terá em sua representatividade e potencial de crescimento no varejo brasileiro. Algo que também acontecerá no mundo, com variação significativa, dependendo da maturidade do mercado e estágio anterior.
E as causas são similares.
Pressionado pela contingência do isolamento imposto pelo vírus e pela cautela derivada da preocupação com a proximidade física, do lado da demanda, consumidores ampliaram suas compras pelos canais digitais. Quem já era usuário habitual comprou mais. Quem não era, descobriu suas vantagens, comodidade e conveniência, mesmo que num primeiro momento o sistema tenha enfrentado problemas pelo abrupto crescimento.
Do lado da oferta, quem já estava estabilizado, Magalu, Carrefour, GPA, Boticário, Natura, C&A, B2W, Via Varejo, Amazon e outros, aproveitou e fez crescer sua participação de mercado imediatamente, pelas vendas diretas e pelo marketplace. Quem não era relevante, tratou de correr e jogar o novo jogo com as novas regras em operações próprias, e (ou) através dos marketplaces dos maiores operadores. E até quem nunca tinha imaginado operar no curto prazo pelos canais digitais teve que correr e implantar.
Também fornecedores do varejo de produtos e serviços trataram de criar, ou desenvolver, seus canais digitais e, na prática, já sabemos, depois de implantado o canal direto de relacionamento com o consumidor, é pouco provável o retorno à situação anterior, pelo aprendizado incorporado.
E até mesmo pequenos e médios negócios tiveram que implantar alternativas como vendas por WhatsApp e outras modalidades. Não faltaram iniciativa e criatividade precipitadas pela necessidade.
Chamaram a atenção as notícias que indicavam que no período de pouco mais de dois meses, na fase inicial da pandemia, teriam sido abertas perto de 110 mil novas lojas virtuais no Brasil, como destacado, mais de uma loja por minuto naquela fase.
Do lado da demanda, essa intimidade, a prática e os aprendizados dos consumidores com as alternativas digitais permanecerão, mantendo elevada, e crescente, a participação desses canais no todo das vendas de produtos e serviços no varejo.
Do lado da oferta, haverá a expansão de possibilidades e inovação para incorporar mais experiência, facilidades, atratividade e conveniência, como o uso iminente das moedas digitais e mais a incorporação de Realidade Aumentada e Realidade Virtual.
O que ficará é a expansão da participação do canal digital em todos os seus vetores, incluindo vendas, relacionamento, promoção, fidelização, propaganda e a reconfiguração da participação dos canais na oferta de produtos e serviços, pelo varejo e também por seus fornecedores de produtos e serviços. Sem falar no impacto da reconfiguração dos centros comerciais, planejados ou não, como shoppings centers, malls e terminais de transporte.
Em especial os shopping centers, que antes se viam como concorrentes do canal e-commerce e, por absoluto bom senso estão mudando sua postura e desenvolvendo alternativas buscando um novo e, se possível, produtivo e lucrativo convívio.
Nesse tema, com certeza, nada será como antes.
Por Marcos Gouvea de Souza, sócio-diretor da GS&MD, uma das maiores empresas de consultoria em varejo e consumo do país